Lampião de Gás

Esse era o título da primeira música ensinada por D. Olga Corsi, minha professora de violão, em meu aprendizado. Impossível esquecer a primeira música dedilhada e cantada, ainda que toscamente, por seus próprios meios, não é mesmo? Mas o
lampião de gás significou muito mais em minha vida.
Meu pai foi um imbatível adepto da casa própria. Pena não ter herdado essa característica dele, o que me custou e custa muito caro até hoje, depois de tantas causas nos tribunais, despejos, humilhações e o pior, a insegurança espalhada por toda a família.
Morávamos em uma casa alugada em um bairro chamado Mirandópolis, entre a Vila Mariana e a Praça da Árvore, em São Paulo, lá pelos idos de 1959. O velho estava impaciente e encontrou uma casa à venda no Jardim Prudência, vários quilômetros adiante do aeroporto de Congonhas, uma lonjura naqueles dias. A casa era grande e estava construída em um bom terreno. Faltava construir a área de serviço, mas sobrava terreno para tanto. A água vinha de um poço local e não havia luz, tampouco. Entretanto, cabia no orçamento e disponibilidade de meus pais e lá fomos nós.
Para um menino de oito anos, foi uma farra. Tirar água do poço usando baldes, tomar banho com água aquecida no fogão e, sobretudo, os lampiões. De dia era legal, mas as noites eram insuperáveis. Meu pai me ensinou a manusear o lampião de gás, desde a colocação do botijão, a camisa e, principalmente, a arte de acendê-lo. Virei expert. Com o tempo, era o encarregado de acendê-los todas as noites e ainda ensinar os novos vizinhos como fazer.
Você não percebe quanto essas coisas são importantes em sua vida até que ouve seu pai todo feliz dar a notícia: “A Light (Companhia de luz na época) permitiu puxarmos uma linha provisória de luz até nossa casa”. Foi um misto de alegria e tristeza, pois me dei conta da perda de meu status de acendedor mor de lampiões de gás. Depois veio a casa da praia, lá na Vila Mirim – Praia Grande, onde pude exercitar minhas capacidades lampiônicas mais uma vez, mas durou pouco, meu pai logo acabou com a farra conseguindo luz e estragando tudo.
Fizeram o mesmo com a cidade de São Paulo, antes toda iluminada com lindos lampiões de gás.
Restou a música, também, que a Inezita Barroso cantou até não ver mais.
Lampião de gás
Lampião de gás
Quanta saudade
Você me traz
Da sua luzinha verde azulada
Que iluminava a minha janela
Do almofadinha lá na calçada
Palheta branca, calça apertada
Do bilboquê, do diabolô
Me dá foguinho, vai no vizinho
De pular corda, brincar de roda
De benjamim, jagunçu e chiquinho
Lampião de gás
Lampião de gás
Quanta saudade
Você me traz
Do bonde aberto, do carvoeiro
Do vossoureiro, com seu pregão
Da vovózinha, muito branquinha
Fazendo roscas, sequilhos e pão
Da garoinha fria, fininha
Escorregando pela vidraça
Do sabugueiro grande e cheiroso
Lá no quintal da rua da graça
Lampião de gás
Lampião de gás
Quanta saudade
Você me traz
(letra Zica Bergami, com os Trovadores Urbanos)
OPS: Aos amigos e leitores que reivindicaram um post sobre a Ressurreição de Cristo, a sugestão é utilizar o serviço de pesquisa gratuito da Gruta e digitar a palavra (Ressurreição) e depois clicar na lupa, se estiver utilizando a opção do topo, ou em pesquisar, se estiver utilizando a outra. Garanto um resultado surpreendente.
Lou, as suas lembranças estão pegando fogo…
De certa, forma você ainda acende algumas luzes…
Quando eu crescer,quero ficar uma velhinha assim,
cantando Lampião de Gás.
Pra mim só Inezita.
Dessas brincadeiras de criança aí eu só não conheço benjamim, jagunço e chiquinho. Que raios seria isso ham?
…isso é coisa para o nosso assessor para assuntos de natureza nada específica Mr.Adiron.
Vixiiiiiiiii,deve ser mesmo legal acender um lampião de gás,se sentir o alumiador de tudo,luz pros caminhos dos outros…importante pa caramba!…em minha meninice nunca tive a oportunidade,pena,né?Tomara alumiar outros cantinhos…
Agora,os Trovadores Urbanos,esses vi bem de pertinho.
Por que será que levamos tanto tempo e tantos tombos até percebermos que as coisas mais belas e mais importantes em nossas vidas são as mais simples?
Tudo seria mais fácil se olhassemos a vida com os olhos de um poeta, que enxerga a beleza no feio, ao invés de um crítico, que encontrar algo de feio por mais belo que possa ser.
Suas lembranças me remetem as minhas, e vejo que apesar dos erros e tropeços estamos escrevendo uma bela história.
Que beleza. A história e a música. Lembrei de minha avó e suas irmãs. Aliás, lembrei de tanta coisa… e tudo coisa boa.
Valeu.
Apenas uma ressalva em relação ao comentário da Bete, não é preciso a brincadeira do copo para invocar dona Zica e perguntar a respeito dos personagens, posso responder agora mesmo. 🙂
Benjamim, Jagunço e Chiquinho eram personagens da revista TICO-TICO. Chiquinho era o personagem principal, Jagunço era seu cãozinho e Benjamim o amigo. Tá resolvido o mistério. A propósito, excelente texto. Abraços!