A Ressaca
Estes fatos me foram narrados por Ben Yaacov, pai de Abi que mantêm uma pousada e restaurante na estrada que liga Beersheba a Pardes Hanna.
Segundo ele, após toda a agitação com a crucificação, a morte e o enterro de Jesus Cristo, naqueles dias em Jerusalém, chegou à cidade o protagonista preferido de Ben, nosso amigo José Vesgo. Depois da prisão de Jesus na sexta-feira, achou por bem visitar um amigo em Jericho. Na verdade, uma saída estratégica, pois fora visto entre os discípulos e poderia ser preso se confundido como um dos seguidores do perigoso rabi, subversivo da Galiléia. Retornou na segunda-feira e não sabia quase nada sobre o que se passara naquele fim de semana fatídico, após a prisão do Mestre.
Ao caminhar pelas ruas de Jerusalém notou as pessoas com olhar baixo e sem disposição para conversas. Parou em algumas lojas, mas não se atreveu a fazer perguntas, mais por medo de levantar suspeitas do que qualquer outra razão. Preferiu dirigir-se à taverna onde era conhecido e certamente ouviria as conversas, sem precisar despertar suspeitas.
Logo que entrou, as pessoas presentes silenciaram. A mulher que servia as mesas disse:
– Ah! Ai está o fujão! Por onde andastes nos últimos dias? Não me lembro de tê-lo visto por aqui desde a sexta-feira. Estávamos todos com saudades, afinal o tínhamos em conta de grande amigo do nazareno errante.
Falou com desdém. Caíram todos na risada, alguém gritou: música! As canecas de vinho foram servidas em nova rodada, alguns se lançaram a dançar e Vesgo ficou amuado em um canto do salão, sem saber o que fazer. Sentou, então, imaginando que logo voltariam a comentar os últimos acontecimentos.
Estava certo, na mesa ao lado, alguém disse:
– Fiquei com pena de Maria. Já não bastava a ela carregar aquela penca de filhos de cá para lá, o tempo todo, ainda perde o mais velho. Se bem que aquele só dava despesa e não queria nada com o trabalho. Desde que o pai morreu, virou pregador. Onde já se viu? Enquanto sua mãe e irmãos passavam fome.
Vesgo apurou os ouvidos, perplexo. Na outra mesa, outra mulher amenizou, tentando ser menos maldosa:
– É, mas eu não desejaria a ninguém ver um filho morto no madeiro, daquele jeito horroroso. Por pior que fosse um filho, nenhuma mãe merece esse sofrimento. E ela ainda limpou suas feridas.
– Garanto que aquele vagabundo não pesou as conseqüências de seus atos. Além de não ajudar sua mãe, agora a deixa nesse estado. Aquela mulher é uma santa. Falou o marido.
Dizem que vem daí a santificação de Maria. E Vesgo continuava abismado com as palavras ouvidas naquele lugar. Já entendera que Jesus morrera crucificado, não só pela sedição, mas também, pelo mal causado à sua mãe. Apurou mais os ouvidos, enquanto sorvia um bom gole daquele vinho soberbo:
– Andam a dizer por aí que ele ressuscitou e está a aparecer a seus seguidores. Disse o homem em pé, na beira da escada.
– É verdade. Meu filho foi até o túmulo do Arimatéia e ele está aberto e o corpo do homem sumiu. Os rumores dão conta de que os discípulos sumiram com ele. Disse o dono da taverna.
– E os guardas romanos que estavam guardando o túmulo? Perguntou o latoeiro que acabara de entrar.
– Dizem que foram encontrados desmaiados e levados pelos companheiros ao pretório. Respondeu o senhorio.
– Para mim os seguidores dirão que ele ressuscitou para continuar iludindo esse povo ignorante. No fundo eles querem é o dinheiro dos tolos.
Vesgo achou que era hora de sair. Isso soara como provocação e um gesto errado poderia acender a ira dos presentes contra ele próprio.
Saiu de fininho e ganhou as ruas novamente e embora concordasse com aquelas pessoas, percebeu a enrascada em que se metera. Corria risco de ser ele pendurado na primeira esquina por algum bando matriarca do caminho. Concluiu que era melhor sumir e deixar a poeira assentar. Desde então, não foi mais visto no centro ou nos arredores de Jerusalém.
Khalil Nasser
Da Série:
Décimo Terceiro Discípulo
Um figurante muito participativo
A Ressaca
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É Lou, eu avisei que onde o José Vesgo anda, é só desgraça. Nenhum comentário? Tá mal. 🙂
Eu bem que pressenti…esse tal de José Vesgo,era mesmo um borra botas.
Taí o Khalil,que não me deixa mentir sozinha…
É Raquel, acho que ele sabia mas ficou com um medão!!!!
Lou, manda um beijão pro Khalil. Grande figura.